O grande passo possível da reforma trabalhista

“Reforma trabalhista” é uma expressão genérica, sem conceituação definida. Para uns, são medidas visando tirar direitos do trabalhador, achatar salários e aumentar o “lucro dos patrões”. Para outros, são medidas urgentes e necessárias, já que a questão trabalhista no Brasil “está muito ruim”.

Apesar dos claros sinais do esgotamento do modelo legalista e inseguro, até pouco tempo atrás parecia improvável avançar em direção à modernização das relações trabalhistas no Brasil.

Entretanto, a realidade se impôs. O trabalho tem alta participação no custo final de produtos e serviços, que cresceu forte nos últimos 12 anos. Uma das causas foi a estagnação da produtividade, que tem relação direta com a regulação trabalhista. O trabalho ajudou a derrubar a competitividade e enfraqueceu a indústria.

Nas últimas duas décadas, novas leis, decretos, portarias e jurisprudências, associados a uma aplicação mais severa das engessadas normas, têm ampliado os custos e a insegurança jurídica. O país é campeão em conflitos trabalhistas. O sistema trabalhista tem virtudes na proteção ao trabalhador, mas virou um freio de mão puxado para investimentos e geração de empregos.

Na reforma dos sonhos do setor empresarial, muitos entraves seriam eliminados nas leis e haveria ampla liberdade para negociar diretamente com os trabalhadores. Nada atrapalharia o poder diretivo e a máxima eficiência.

Em uma visão mais elaborada, a reforma passaria por uma simplificação da legislação e mudança na estrutura sindical. Migraríamos para um modelo de liberdade e pluralidade sindical, buscando maior representatividade e amplo escopo de negociação coletiva e, em grande medida, até direta com os trabalhadores mais preparados.

Ambas as propostas são legítimas, mas, no curto prazo, parecem pouco viáveis no nosso nó jurídico, institucional e político.

Analisando em partes, observa-se que, dentro do nosso complexo processo legislativo, consertar um mundo de leis para adequá-las a uma infinidade de situações, cada vez mais mutantes e dinâmicas, é um desafio com chance nula de sucesso.

Pular direto para a ampliação da liberdade de negociação entre empresa e empregado vai de encontro ao princípio da hipossuficiência, questionado em diversas situações. Fato é que os trabalhadores hoje são tutelados pela lei e, num processo evolutivo, deveriam primeiro passar à tutela dos sindicatos.

Defende-se a reforma sindical, com pluralidade e outras melhorias, visando garantir sindicatos fortes e representativos. Essa é outra questão complexa. Não parece ser o momento. A expressiva maioria dos nossos trabalhadores é representada por sindicatos fortes, que negociam diversos temas e conquistam, ano após ano, ganhos reais e novos direitos. Uma reforma malfeita pode levar à desestruturação do que equilibra a negociação.

Nesse contexto, a proposta apresentada acerta na estratégia e na direção. Hoje é a reforma possível, ainda que venha a avançar um pouco mais. Abre à negociação temas como jornada, funções e salários, em que o sistema atual traz mais restrições à produtividade e mais insegurança jurídica, e resolve uma parte expressiva do problema.

O modelo não é o mais cômodo para os gestores. As negociações não serão fáceis e todos os problemas não estarão resolvidos com sua aprovação. As condições para isso é que estarão criadas.

Haverá resistências no Judiciário. Entretanto, o processo de amadurecimento de todos vai acontecer no seu tempo e, mesmo que lentamente, o país dará um grande passo na direção certa.

 

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Emerson Casali

Emerson Casali

Diretor de Relações Institucionais na CBPI Produtividade Institucional, atuou anteriormente na TV Globo e na Confederação Nacional da Indústria (CNI), onde foi responsável pela Unidade de Relações do Trabalho e Desenvolvimento Associativo. Coordenou a elaboração das “101 propostas para modernização trabalhista da CNI”. É engenheiro com mestrado em Administração.