Negociações coletivas na crise pós reforma trabalhista

É inegável que a reforma trabalhista da Lei nº 13.467/17 trouxe gigantesco impacto para os sindicatos, acostumados que estavam com a contribuição sindical compulsória e que, agora, devem remar contra a maré na busca da preservação de receita. As notícias da mídia e as revelações de dirigentes sindicais causam espanto, no mínimo. Os aspectos jurídicos das negociações coletivas e seus efeitos parecem não importar mais.

Diante da situação de incerteza, para preservar receitas, os sindicatos poderiam adotar dois comportamentos: (i) de forma autêntica e legítima convencer os trabalhadores de que o sindicato é corpo e alma de seus próprios interesses e que a contribuição fortaleceria a busca por novas conquistas trabalhistas; ou (ii) de modo autoritário e ilegítimo, sob o manto da negociação coletiva, transferir aos patrões, sem fundamento jurídico e legitimidade, a obrigação de descontar a contribuição sindical de trabalhadores associados ou não, agora realocada no instrumento normativo, com nomes diversos, sendo mais comum o de taxa negocial.

O primeiro comportamento exigiria que se despertasse nos trabalhadores, de forma mais avolumada, o gosto pela representação sindical, o que parece não ser tarefa fácil porque a unicidade sindical somada ao intervencionismo enorme do Estado no conteúdo dos contratos de trabalho afastou, estrategicamente, os trabalhadores dos sindicatos.

O discurso de que a Reforma Trabalhista é uma forma de suprimir direitos dos trabalhadores tem sido usado e propagado com pânico geral para atrair os menos informados. Todavia, logo se esvaziará porque os trabalhadores perceberão que os direitos sociais continuam como antes e que, de fato, eles ganharam o livre arbítrio de manifestar a liberdade de contribuir ou não aos respectivos sindicatos.

No segundo comportamento, o da negociação coletiva, os sindicatos laborais contam com dois aspectos relevantes: a fragilidade de muitos sindicatos patronais e uma voz de alguns segmentos da Magistratura Trabalhista que lutam pela preservação do antigo modelo que, não se compreende bem, a quem teria beneficiado se tantas mazelas causou.

Por meio da negociação coletiva, os sindicatos pretendem o retorno da burocratização, por exemplo, da homologação do Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho perante o Sindicato, ou a transferência para o empregador de obrigação ilegítima do desconto da contribuição sindical dos salários de seus empregados.

Este comportamento de sindicatos laborais impõe aos sindicatos patronais muita consistência e seriedade em relação aos seus representados e deverão adotar posição de responsabilidade ímpar sob pena de criar para o setor econômico enorme contingência trabalhista. O setor econômico emprestar a sua mão para tirar do salário do empregado, à revelia deste, a contribuição sindical e com esta mesma mão entregá-la ao sindicato não é mais tarefa legalmente imposta às empresas.

A jurisprudência já não permitia que sindicatos de empregados assim dispusessem.

Esta situação caótica e de insegurança permite que os sindicatos mais representativos se imponham com obrigações juridicamente inconsistentes. O Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 40 para dizer, quanto à contribuição confederativa, que “A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição Federal, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo”.

O fundamento essencial dessa orientação jurisprudencial é de que a imposição de pagamento a não associados de contribuições para custeio de entidade sindical fere o princípio da liberdade sindical, além de violar a regra de proteção ao salário.

Portanto, a regra do artigo 513 da Consolidação das Leis do Trabalho que permite às entidades sindicais impor contribuições tem eficácia apenas e tão somente em relação aos seus associados.

Para as empresas, o atual cenário da aplicação da legislação trabalhista, no âmbito individual, merece avaliação acurada e muita cautela para observar o texto da lei e verificar o que seria pertinente em suas operações. No âmbito das relações coletivas, negociar de forma participativa, observando sempre que, a partir da contribuição sindical facultativa, o atual modelo de organização e representação sindical se transforma e os debates no local de trabalho terão mais ressonância do que os das negociações em âmbitos territoriais mais largos.

Portanto, as negociações coletivas não podem servir de instrumento de ilegalidades e arbitrariedades. Merecem construir algo com bom senso e com olhar para o futuro.

 

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Paulo Sergio João

Paulo Sergio João

Advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).