Dispõe sobre a prestação de serviços a terceiros – PL 2938/2019

As Leis nº 13.429, de 31 de março de 2017, e 13.467, de 13 de julho de 2017, promoveram alterações na Lei nº 6.019, de 1974, com o objetivo de regulamentar a prestação de serviços a terceiros (a denominada terceirização), introduzindo vários dispositivos legais no diploma legal que inicialmente tratava apenas do trabalho temporário.

Embora tais alterações não tenham autorizado a prática da “pejotização”, a nova redação da lei tem gerado dúvidas e interpretações contraditórias, inclusive pela Justiça do Trabalho, criando um ambiente de insegurança jurídica, efeito oposto ao pretendido e que causa prejuízos aos trabalhadores, à previdência social e também às empresas, razão pela qual o presente projeto pretende dar clareza e exatidão às normas, evitando seu desvirtuamento.

Importante lembrar que a denominada “pejotização” é uma fraude trabalhista, uma simulação, pois consiste na contratação de trabalhador subordinado (empregado no plano dos fatos) como sócio ou titular do empregador, mecanismo voltado a mascarar vínculo empregatício por meio da formalização contratual civil. Daí se origina o neologismo “pejotização”, no sentido de transformar artificialmente um empregado em pessoa jurídica.

A atual conjuntura econômica e social revela a necessidade de o legislador atentar-se ao desvirtuamento e utilização indevida do contrato de prestação de serviços para fraudar a relação de emprego, impedindo que empresas contratantes exijam ou induzam os trabalhadores a constituir pessoas jurídicas para figurar como supostas empresas prestadoras de serviços.

Esse tipo de irregularidade tem se tornado cada vez mais comum, ocasionando uma migração dos empregos formais para os micros e pequenos empreendimentos fraudulentos. Nesse processo, não há geração de novos empregos, mas apenas o crescimento desenfreado da precarização das relações trabalhistas, acarretando consequências extremamente negativas à vida dos trabalhadores e à economia do país.

Nesse sentido, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) emitiu a Recomendação nº 198, orientando aos Países Membros que:

“A política nacional deve incluir, pelo menos, medidas destinadas a: (…)

(B) lutar contra as relações de trabalho encobertas, no contexto de, por exemplo, outras relações que podem incluir o recurso a outras formas de acordos contratuais que ocultam a verdadeira situação jurídica, entendendo-se que existe uma relação de trabalho encoberta quando um empregador considera um empregado como se não o fosse, de uma maneira que oculta sua verdadeira condição jurídica, e que podem ser produzidas situações nas quais os acordos contratuais dão lugar a que os trabalhadores se vejam privados da proteção a que tem direito”.

Esse contexto é extremamente preocupante, pois tem gerado a perda de direitos sociais, além de impactos na saúde e segurança do trabalhador, na medida em que, por exemplo, deixa de estar sujeito aos limites da jornada de trabalho aplicáveis aos empregados, sendo que muitos profissionais trabalham um número excessivo de horas diárias quando “pejotizados”.

Ao ser artificialmente convertido em pessoa jurídica, o trabalhador perde o direito ao décimo terceiro salário, às horas extras, às verbas rescisórias, ao salário mínimo, ao piso salarial estadual, aos intervalos remunerados (descanso semanal remunerado e férias com adicional constitucional de um terço), ao vale-transporte, ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), entre outros direitos garantidos pela lei ou em acordos e convenções coletivas; além de trazer muita insegurança ao empregado que labora em tais condições, sem nenhuma garantia, visto que fica sem os direitos concernentes na ocorrência do acidente de trabalho, como a garantia do emprego de um ano após o término do auxílio-doença.

O afastamento da relação de emprego em face de mero ajuste formal que observe os requisitos de validade do negócio jurídico é incompatível com o regime constitucional de proteção à relação de emprego, como elemento base para o acesso aos direitos sociais, em especial as normas do arts. 7º, I, e 170, VIII, da Constituição Federal.

A irregularidade atinge trabalhadores de quase todas as categorias, mas é mais presente em algumas delas, sendo que na área da saúde a prática da “pejotização” é conduta costumeira, sobretudo para os médicos, com intensa precarização das condições de trabalho dos profissionais da medicina.

Como nesses casos há redução remuneratória e de proteção à saúde e segurança, assim como pressão por ampliação da jornada, verificam-se inúmeros efeitos na saúde dos trabalhadores, inclusive havendo diversas pesquisas e estudos relacionando a síndrome de burnout e o erro médico às longas jornadas de trabalho dos profissionais da saúde, que nesses casos (pejotização) estão desprotegidos. Obviamente, tais situações impactam não apenas os profissionais, mas também os pacientes por eles atendidos.

A contratação fraudulenta através da “pejotização” vem sendo utilizada indiscriminadamente nos mais variados ramos da economia e atinge todos os tipos de empregados, não apenas os que recebem salários mais elevados, gerando discussões tanto na justiça trabalhista, quanto em inúmeros processos administrativos que tramitam no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), como o de nº 11040.7221120/1015-04, que trata da contratação de vendedores e gerente de recursos humanos8, ou nº 10166.728615/201126, que reconheceu a fraude na contratação de médicos por um hospital.

Os efeitos da “pejotização” também atingem a arrecadação fiscal, como demonstram diversos estudos, inclusive da Receita Federal. Nesse sentido, estudo elaborado pelos economistas José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasilense de Direito Público (IDP), e Juliana Damasceno de Souza, pesquisadora do FGV Ibre, aponta que “As mudanças nas relações de trabalho, com o aumento do número de contratados como pessoa jurídica – prática chamada de pejotização –, viraram uma ameaça ao sistema de arrecadação da Previdência e podem comprometer os benefícios futuros da reforma em curso”.

Os dados estatísticos trazidos pelo estudo mostram que, entre 1996 e 2017, o número de contribuintes com renda acima de sete salários mínimos caiu 25%. Já aqueles com renda mais baixa, de até sete salários, no mesmo período, cresceram 158%.

Importante frisar que as alterações ora propostas não afetam as pessoas jurídicas prestadoras de serviço que atuam efetivamente como tais, assumem os riscos da atividade empresarial e colhem os frutos do seu lucro, mas visam coibir as fraudes e os desvirtuamentos, pois conforme demonstrado acima, a “pejotização” vem sendo utilizada de modo indiscriminado para fraudar a relação de emprego, fato que gera inúmeros problemas sociais, econômicos e fiscais.

A Lei 13.429/2017 trouxe alterações importantes no sentido de modernidade e com regras claras. Já o presente PL está procurando dificultar a contratação de mão de obra temporária, pois sabemos que, muitas vezes, o profissional depois de trabalhar como temporário é efetivado. Nesse momento de falta de oportunidades, o trabalho temporário é muito importante.

 

Conclusão:

Por estas razões, o CORHALE manifesta-se desfavorável à aprovação do PL

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