Permite a portabilidade do cartão refeição/alimentação – PL 975/2021

Os empregadores, embora já tenham incentivos fiscais, adquirem com desconto cartões refeição/alimentação, ofertados pelas empresas que os fornecem. Esse desconto é compensado por taxas de reembolso elevadas, pagas pelos estabelecimentos credenciados às empresas emissoras de cartão refeição/alimentação.  Assim, os demais consumidores subsidiam os descontos que favorecem os empregadores (“subsidio cruzado”).

Este PL propõe, para equilibrar o mercado, que cada empregado passe a determinar a marca do cartão refeição/alimentação de sua preferência, podendo transferir 100% do valor dos créditos a qualquer outra empresa concorrente, a título de “portabilidade” similar ao que já ocorre na conta-salário. Desse modo, as administradoras de cartões refeição/alimentação não poderão mais oferecer, nem celebrar contratos com descontos aos empregadores, porque o desconto inviabilizaria a portabilidade de 100% do valor do benefício.

Apesar das intenções meritórias do autor, trata-se de experimentalismo arriscado, a pretexto de “modernização” no âmbito do PAT – Programa de Alimentação do Trabalhador, já postulado por fintechs e por uma grande empresa de delivery, autointituladas novas “entrantes”, perante a Secretaria de Trabalho, vinculada à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia. Tais propostas de “modernização” incluem ainda o chamado “arranjo aberto”, no qual a rede de estabelecimentos seria ampliada,  bastando ter um CNPJ, sem a averiguação de critérios nutricionais e sanitários, incluindo a produção de comida em locais não abertos ao público, também conhecidos como “dark kitchen” e “ghost kitchen”.

A expectativa é que isso aumentaria a competição, reduziria os descontos obtidos pelos grandes empregadores e, consequentemente, reduziria as taxas cobradas dos restaurantes credenciados. No entanto, é preciso considerar as consequências ruinosas desses experimentalismos, agravadas pelo monopólio da plataforma tecnológica (aplicativo) necessária e pelo momento de grave instabilidade econômica. Além disso, haveria as seguintes consequências negativas:

(1) ocorreria o fracionamento entre vários fornecedores contratados, perda de economia de escala e aumento de preços;

(2) causaria enormes dificuldades operacionais aos empregadores, dificultaria e oneraria a contratação de outros benefícios com o mesmo fornecedor, a exemplo do vale-ransporte, sendo um desincentivo ao empregador;

(3) aumentaria o risco de crédito e inadimplência das empresas recebedoras de portabilidades;

(3.1) segundo as novas entrantes este risco será “precificado”, ou seja, adicionado ao preço, elevando-o;

(4) os empregadores perderiam a gestão sobre o fornecedor e o respectivo contrato, e,

(4.1) ficariam impedidos de exigir, em prol do trabalhador, a devida averiguação da qualidade nutricional e sanitária da refeição servida e dos estabelecimentos fornecedores;

(5) o trabalhador não tem propriedade plena sobre o voucher refeição/alimentação, portanto não pode exercer a sua portabilidade individual, como já ocorre com a conta-salário, inclusive porque o benefício concedido pelo empregador não é salário;

(5.1) a propriedade implica o direito de alienação (venda) da coisa, e o trabalhador beneficiado não pode vender o voucher refeição/alimentação;

(6) a portabilidade direcionaria o uso do benefício ao delivery, cujas taxas e tarifas por antecipação do pagamento, cobradas dos restaurantes e similares, atingem ou superam 27%;

(7) todas as dificuldades operacionais e consequências judiciais trabalhistas, inclusive o previsível monopólio da plataforma tecnológica de portabilidade (aplicativo), elevarão demasiadamente o custo do benefício pago pelo empregador e inviabilizarão a gestão do benefício, sendo um enorme desincentivo ao empregador;

(8) isso prejudicaria os trabalhadores, inclusive pela provável redução do valor do benefício ou até pela sua não concessão, considerando que é facultativamente tratado em acordo ou convenção coletiva de trabalho;

(9) a imposição de arranjo de pagamento aberto e a portabilidade dos vouchers violaria o princípio da segurança jurídica, afetaria centenas de milhares de contratos e provocaria inumeráveis ações judiciais;

(10) como se não bastasse, a implantação da portabilidade demandaria a criação de uma agência de “compensação” ou órgão similar, sob a tutela da Secretaria do Trabalho, pela qual passariam as inumeráveis portabilidades;

(11) isso certamente aumentaria imensamente o “custo Brasil” e a burocracia, em prejuízo dos contribuintes, dos empregadores e dos trabalhadores, ainda mais no presente ciclo de pandemia e grande instabilidade da economia.

 

CONCLUSÃO:

Pelas razões expostas acima, o CORHALE manifesta-se desfavorável ao presente projeto de lei.

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