A miopia de nosso legislativo nacional nas relações de trabalho

Cada vez mais somos (os membros do CORHALE, especialmente) surpreendidos com a miopia que ronda nosso legislativo nacional, Senado e Câmara Federal, ao propor leis e alterações em nosso ordenamento jurídico. Refiro-me particularmente aos projetos destinados à área trabalhista e que afetam a gestão de pessoas.

Temos testemunhado mensalmente uma avalanche de proposições que visam a ampliar direitos, garantias e vantagens aos empregados e quase nenhuma que incentive a empregabilidade, a eliminação de conflito, a redução de encargos sociais ou a melhoria do relacionamento capital x trabalho.

É sabido que o Brasil vem perdendo continuamente a competitividade de sua mão de obra devido ao alto custo que ela possui. Veja bem: alto custo não quer dizer alto salário, pois nosso salário mínimo ainda é um dos menores da América Latina (nem vale comparar com Estados Unidos ou Europa, pois seria brincadeira), perdendo para inúmeras economias que nem sequer se aproximam da nossa, como é o caso da Colômbia, Venezuela, Argentina e Chile. O alto custo vem dos encargos sociais, benefícios assegurados, vantagens enormes e outras benesses frequentemente criadas e sugeridas por nossos legisladores, na ânsia de se valerem delas para obter votos na próxima eleição.

Vamos aos exemplos. Alguém pode assegurar que o pagamento de adicional de periculosidade evita, impede ou elimina o risco de vida do empregado que o recebe? Pois é, não me parece lógico achar que, criando adicionais, evitamos riscos ou acidentes. Pois não é que este foi o fundamento para que nossos legisladores propusessem e aprovassem projetos de lei como os que criaram o adicional de periculosidade para bombeiros civis, vigilantes e recentemente para motociclistas. Imaginem todos que, da noite para o dia, sua mão de obra passe a custar 30% a mais, sem que isso estivesse em seu orçamento, nem de seu cliente.

Fácil dizer que é algo difícil de engolir em qualquer sociedade desenvolvida, mas aqui… bem, deixando de lado esses reflexos, pergunta-se: o nobre objetivo pretendido pelos parlamentares, redução do risco de vida, teria sido atingido? Vejamos o que diz a Previdência Social a respeito. No dia 03/07 p.p., ouvido em audiência pública, na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, o coordenador-geral de Monitoramento dos Benefícios por Incapacidade do Ministério da Previdência Social, Paulo Rogério de Oliveira, afirmou que três acidentes de trabalho ocorrem a cada hora no Brasil. Ainda, segundo ele, a Constituição de 1988 ainda não está plenamente em vigor na questão trabalhista, faltando regulamentar diversas matérias referentes à saúde do trabalhador. “Não temos uma lei de periculosidade no trabalho e também não regulamentamos a aposentadoria especial no Brasil”, disse. Ele também propôs a regulamentação do adicional de insalubridade com base na carga horária. “A redução do risco é direito do trabalhador”, acrescentou.

Tal matéria foi publicada no periódico Última Instância, site jurídico, na data de sua declaração. A matéria ainda completa com manifestação do deputado federal que requereu a audiência, deputado Amauri Teixeira (PT-BA), que ressaltou que o impacto desses acidentes sobre a Previdência Social gira em torno de R$ 70 bilhões, incluindo auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão vitalícia ao cônjuge, no caso de acidentes fatais. Além disso, há impactos sobre o Sistema Único de Saúde (SUS). “Precisamos atuar para reduzir o número de acidentes de trabalho”, completou.

Volto a perguntar: quem pode dizer que pagar periculosidade evita ou previne acidentes? Lamentavelmente, todos sabemos que não. O aumento de pagamento apenas fará incentivar empregados a procurarem essas profissões, na tentativa de melhorar seus ganhos, e seguiremos crescendo nos números de acidentes, mutilações, mortes, etc. Infelizmente, a mesma coisa ocorre em outras áreas, quando o parlamentar propõe benefícios, garantias e outras que deveriam ser dever do Estado, mas passam a ser atribuídas à iniciativa privada, que segue contribuindo com seus impostos e só vê aumentar o custo da mão de obra.

Esta miopia precisa ter um fim. Vivemos a lei da causa e efeito: mais direitos, mais vantagens, mas benesses, significa menos emprego decente, mais fraudes, mais informalidade e mais conflitos na Justiça do Trabalho, que já recebe quase 3 milhões de ações por ano. Está na hora de dar um basta. Pensemos nisso!

 

Os artigos publicados no Radar Corhale são de inteira responsabilidade de seus autores, bem como os conceitos e opiniões neles emitidos.

 

Wolnei Ferreira

Wolnei Ferreira

Advogado e administrador, pós-graduado em Recurso Humanos, é sócio titular do escritório Ferreira Rodrigues Sociedade de Advogados. Atua também como diretor jurídico da ABRH-Nacional e da Sobratt – Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades, diretor tesoureiro do Sindicato das Sociedades de Advogados de SP/RJ e membro convidado do Conselho Superior Jurídico da Fiesp.